quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

PRISÃO COMO PENA

          A pena de prisão teve sua origem nos mosteiros da Idade Média, como punição imposta aos monges ou clérigos faltosos, fazendo com as suas celas para se dedicarem, em silêncio, à meditação e se arrependerem da falta cometida, reconciliando reconciliando-se com Deus.
      Essa ideia inspirou a construção da primeira prisão destinada ao recolhimento de criminosos, a “House of Correction ia Correction”, construída em Londres entre 1550 e 1552. Porém, a privação da liberdade iniciou-se na Holanda, como pena, a partir do século XVI, quando, em 1595, foi construída a prisão “Rasphuis” de Amsterdã.

          Anteriormente, o aprisionamento não trazia caráter de pena, e sim a garantia de manter a pessoa á espera da punição a que seria imposta. Assim como não existia legalmente uma sanção penal a ser aplicada, mas sim punições a serem concretizadas, também não existiam penitenciárias. Os locais que serviam de clausura eram diversos, desde calabouços, aposentos em ruínas ou insalubres de castelos, torres, conventos abandonados, enfim, toda a  edificação que proporcionasse a condição de cativeiro, lugares que preservassem o acusado até o dia de seu julgamento ou execução.

          Como enclausurar não era a finalidade última, não havia necessidade da existência de um local específico, portanto, ainda não se pleiteava uma arquitetura penitenciária própria, pois o cárcere era visto como local de custódia para manter aqueles que seriam submetidos a castigos corporais e à pena de morte, garantindo, dessa forma, o cumprimento das punições.

          A confissão pública de crimes, a amputação de membros, os gales e o pelourinho vão sendo abolidos no decorrer do processo histórico iniciando com a formação do Direito Penitenciário.

        Com a obra, Dos Delitos e das Penas Cesare Beccaria inaugurou a Criminologia, levando ao estudo do tratamento dos criminosos. Em sua obra ele lutou contra a tortura e o testemunho secreto, influenciou a reformulação do Direito Criminal, a fim de que fosse promovida uma maior humanização da pena. As ideias defendidas por Beccaria podem ser localizadas hoje nos princípios que regem os Direitos Humanos, existentes no Ordenamento Jurídico moderno.

          Ressalta na sua obra que não era importante o rigor da lei, mas a efetividade de seu cumprimento; defende também, a existência de leis simples pelo povo, já que só as leis poderiam fixar as penas, conhecidas pelo povo, já só as leis poderiam fixar as penas, como também o fim dos confiscos e das penas cruéis.

          A Independência Americana de 1776 culmina com a “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” (1789) e com a Constituição Francesa de 1791. Estes últimos acontecimentos integram a chamada “Revolução Francesa”, considerada como o acontecimento que deu início à Idade Contemporânea e proclamou os princípios universais da “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” (Liberté, Égalité, Fraternité), frase de autoria de Jean-Jacques Rousseau.

          Em um primeiro momento, a Revolução proporcionou o período conhecido na história como “terror”. No período do terror, milhares de pessoas foram guilhotinadas, contudo, como num efeito reverso, após o terror, foi reforçado o conceito de prisão como pena.

É na conjuntura de crítica da tirania que se desenvolve o discurso jurídico de princípios, prosperam as ideias de legalidade e de outras garantias, além dos conceitos de punir ao invés de vingar, difundidos por Beccaria.

          A sociedade transformava-se, os novos costumes faziam com que a criação da pena de prisão fosse apresentada como uma evolução dos costumes morais da sociedade, um legado do Iluminismo e do Liberalismo. Com base na filosofia do aprisionamento, foram elaborados sistemas arquitetônicos previamente pensados com a finalidade de punir o homem.

          Segundo Foucault, no decorrer do século XVIII, a classe politicamente dominante abrigou-se atrás da instalação de um quadro jurídico explícito, codificado, formalmente igualitário, por meio da organização de um regime do tipo parlamentar representativo.

          O desenvolvimento e a generalização dos dispositivos disciplinares constituíam outra vertente, obscura, desse processo. A forma jurídica geral, que garantia um sistema de direitos em princípio igualitários, era sustentada por esses mecanismos miúdos, cotidianos e físicos, por sistemas de micropoder, essencialmente igualitários e assimétricos que constituíam os regimes disciplinares.

          A disciplina impõe-se sem força excessiva, por meio de uma atenta observação.
          Disto deriva a necessidade de uma peculiar forma de instituição que, segundo Michel Foucault, é bem exemplificada pelo pan-óptico de Jeremy Bentham.

          O Pan-óptico era a suma encarnação de uma moderna instituição disciplinar.
          Consentia na constante observação caracterizada pala “visão desigual”. Efetivamente, talvez a mais importante característica do Pan-óptico resida em seu planejamento arquitetônico, ao qual o recluso não poderia nunca saber quando efetivamente era observado. A incerteza gerada pela “visão desigual” a ideia de se estar sendo observado.

Especialmente na prisão o paradigma do Pan-óptimo oferece a forma ideal de punição moderna. Segundo Foucault, este é o motivo pelo qual a punição das correntes e trabalhos forçados teve de ceder lugar ao cárcere. Este último era modernização ideal da punição.
          Um marco importante para o ideal de “condição humana ao aprisionamento”
surge a partir da obra humanitária do inglês John Howard, no seu livro State of Prisons. Em 1866, foi fundada, na Inglaterra, a Liga Howard para a Reforma.

          O Direito Penitenciário resulta da proteção do condenado, visando respeitar a dignidade do homem como pessoa. Em seguida, surgem as correntes doutrinárias que investigaram o fundamento e o fim da pena: as absolutas, as relativas ou utilitárias, e as mistas.
          Destas correntes doutrinárias decorrem escolas de execução penal com novos estudos sobre o aperfeiçoamento do sistema penitenciário, delinquência e definições do delito, apontando quais são os limites e suas manifestações, entre elas: a Escola Clássica (Beccaria, séc. XVIII), Escola Positiva (Lombroso, séc. XIX) e a Escola Sociológica (final do séc. XIX).
          Durante a chamada Escola Clássica, desenvolve-se o conceito da Teoria da Honra, que considera o crime tão somente fato-jurídico. Até hoje o princípio da anterioridade da lei, oriundo da Escola Clássica, serve como fundamento para aplicação das penas (não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal).

          Nos fins do século XIX surge a Escola Positiva com Enrico Ferri. Para ele, o criminoso não deveria ser punido, e sim tratado, pois não é um homem normal. Ferri foi aluno de Cesare Lombroso que definiu o criminoso em três teorias: Teoria Antropológica Atávica. Uma pessoa seria predestinada ao crime por um ser atávico, noção ligada à regressão do homem ao primitivismo a que na Biologia era chamada de degeneração. Na Teoria da Epilepsia. A patologia seria a causa da degeneração, atacando os centros nervosos, deturpando o desenvolvimento do organismo ou produzindo regressões que conduziam ao nascimento do criminoso. A terceira, a Teoria da Loucura Moral – pregava que mesmo um homem inteligente poderia se tornar um criminoso por ter suprimido o senso moral.

Em seu livro, Anatomia Patológica e Antropometria do Crime, Lombroso expõe o estudo referente ao exame da capacidade craniana de 383 criminosos.
Estuda o suicídio entre os criminosos, a moral, religião – detentora de um aspecto sensual e acomodam-te a inteligência portadora de anomalias, e a instituição como traços rechaçados pela preguiça, volubilidade de espírito, imprevidência e zombaria.

          No capítulo intitulado “Antropometria e Fisionomia de 3.939 criminosos”, ele conclui que os homicidas teriam o rosto pálido e imberbe, testa pequena, os olhos afetados por estrabismo, ar suspeito e o olhar vítreo, frio, imóvel e injetado de sangue. Os órgãos também apresentavam anomalias e estava assim delineada a “Teoria Degenerativa e Antropológica da Delinquência".

          Ferri trouxe à teoria de Lombroso o aspecto social; o criminoso não seria predestinado ao delito, mas predisposto à prática de fatos criminosos. A chamada Teoria da Responsabilidade Social defendida por Ferri, não aceitou a liberdade da vontade psíquica do homem. Defendia a responsabilidade social em substituição responsabilidade pessoal dos classicistas, pala a casualidade criminal estaria reduzida à figura do autor do delito.
Mas a própria descrição/classificação biológica do sujeito criminalizável será a explicação do seu crime e de sua tendência á criminalidade.

          As diversas teorias que surgiram depois do positivismo são agrupadas com o nome genérico de teorias sociológicas ou escolas liberais contemporâneas.

          A Baratta (1999) mostra que as teorias liberais se contrapuseram às teorias positivistas, com o objetivo de focar o fenômeno do crime a partir de uma definição sociológica, não deixando a definição de criminoso a serviço apenas do Direito Penal.

          Entre as teorias liberais encontram-se linhas que apoiaram o caráter normal e funcional da pena (Teoria Funcionalista), que abordaram a estratificação social (Teoria da Subcultura), que deslocaram o foco do comportamento para a função punitiva e para o Direito Penal (Teoria Psicanalítica), etc.

Fonte: Pesquisa Cientifica - Reflexos da Pena – Prevalência dos Direitos Humanos 
Autor: Sidney Soares de Oliveira 
Instituição Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo